Meses atrás provocamos nossos vizinhos a escreverem uma mensagem para as árvores que admiram, que cruzam os seus caminhos, que embelezam e acolhem passarinhos nas praças, que fazem sombra em suas calçadas, que oferecem um deleite para seus olhares.
E por qual razão fizemos esse convite? Porque precisamos das árvores mais do que nunca. Seja por questões socioambientais, seja porque são maravilhosas, as admiramos e as queremos bem.
Aqui vão trechos das declarações de carinho e cumplicidade que recebemos. Já contou pra sua árvore preferida o quanto ela é importante pra você?

Adriana – Pau brasil
“Nesta foto você ainda não havia sido plantado, como não estou em São Paulo, recorri ao Google Maps e à minha memória, te desenhei, espero que não se ofenda meu caro Pau-Brasil. Não foi fácil te escolher, meu impulso inicial era escolher a pitangueira que ficava no parquinho da escolinha Alto de Pinheiros, onde enquanto eu, bem pequenininha, subia no trepa-trepa, brincava comendo pitangas, era um refúgio certeiro. Te escolhi pois é pequena também e por isso simboliza para mim a esperança. A esperança que um dia grades não sejam necessárias (como hoje são), que você possa testemunhar o crescimento desta cidade como uma cidade onde o medo não prevaleça e sim o respeito entre pessoas e ideais. A memória preservada e o futuro calçado com saúde e qualidade de vida. Que você possa apreciar um bonito pôr do sol todos os dias, mesmo nos dias de chuva.”
Aida – Ipê amarelo
“Querido Ipezinho Amarelo, adoro acompanhar o seu crescimento, olhando pela janela todas as manhãs! No ano passado, ainda tão pequeno, já mostrou a que veio, com sua florada que iluminou a rua. Você é agora um adolescente espichando bem rápido, quase alcançando os fios elétricos. Estou temerosa de quando chegar a hora do pessoal da Enel vir podar você. Espero que venham profissionais cuidadosos, que façam um trabalho que não prejudique a sua saúde. Que você possa ser tão frondoso quanto o Ipezão Rosa do outro lado da rua, que também vi crescer.”


Ana Lu – Ficus
“…muitas de sua espécie foram inspiração para vários poetas e pintores … Porém, essa mesma espécie humana que te reverencia, também é capaz de te arrancar impiedosamente de seu habitat para dar lugar a poderosos empreendimentos imobiliários, dos quais estão destruindo também as nossas nascentes – cenas muito tristes que me deparo frequentemente em nosso bairro. Não é apenas uma árvore que é derrubada… afeta a biodiversidade, a devastação de um ecossistema inteiro. O desrespeito e a hostilidade contra a natureza, revela a decadência humana. Sabe, quando me aproximo de você sinto uma conexão maior com a espiritualidade e coragem para acreditar que depois do seus ciclos de floração, frutificação e queda das folhas, vem a superação de se renovar. É dessa forma que encontro forças em minha jornada… Com esperança em dias melhores do porvir. Obrigada meu querido Ficus, por tantos ensinamentos que você me traz!


Ana Marta – Flamboyant
“Querido Flamboyant, você e seus irmãos me lembram meu pai. Há mais ou menos 35 anos ele plantou uma passarela de Flamboyans na entrada do sítio em Minas aonde viveu os últimos anos da vida, e se reunia com os filhos, netos, parentes e amigos nos fim de semana […] Essa passarela de flamboyants presenciou sua despedida indo para a morada final na sua terra natal, netos crescendo, brincando, bisnetos chegando, seguiu a construção de uma capela que trouxe batizados , casamentos e festas. O Futuro não sabemos mas como você os seus irmãos Flamboyants do sítio do meu pai presenciarão muitas histórias e tem muito o que nos ensinar. Obrigada e que você continue crescendo com saúde e tendo o respeito que você merece.”
Antonio – Eucaliptos
Sempre admirei o tamanho de vocês.
Quantos anos têm?
São uma família?
Quantas coisas já viram passar.
São maiores que os prédios ao lado,
dez andares de concreto
e vocês ali, firmes,
no meio do caminho da Caminha.
Como pode tanta força brotar da terra?
Quando o vento sopra forte
e vocês se agitam,
é medo de cair?
Vocês são gigantes.
As maiores das grandes.
E são muitas.
Deve ser difícil ver todas as crianças dali,
correndo entre raízes e folhas caídas.
Nós olhamos de baixo,
pequenos, curiosos,
tentando entender como é
ver o mundo lá de cima.
Que vocês possam continuar nos olhando.
Continuar cuidando.
Continuar ficando.

Bárbara Babi – Mangueira
“Majestosa, abrigo de vida, morada de pássaros que chegam atraídos por seus frutos. Me lembra aquela da minha infância, tão generosa quanto, onde subíamos nos galhos, brincávamos no balanço, descansávamos na rede e colhíamos as mangas, tão abundantes, nas férias de fim de ano…”


Bárbara
Querida Árvore, escrevo-te com o coração cheio de admiração e gratidão. Eu, que vivi a infância em uma casa com jardim, horta e pomar, não sei identificar a tua espécie. Não importa, um dia, aprenderei. O que, sim, importa é reconhecer que você embeleza as minhas caminhadas pelo bairro enquanto, silenciosamente, contribui para o equilíbrio do nosso planeta. Não que o planeta esteja equilibrado. […] Resiliente, sobrevives próxima das que não têm a mesma sorte e sofrem cortes estúpidos de seus galhos por agentes da companhia elétrica que teimam em culpá-las por falhas em vez de enterrar os fios. Ou de outras ceifadas pela ignorância de moradores e comerciantes. Que dádiva poder te fotografar, deixando registrada a tua presença que um dia observou os meus momentos tristes e os alegres ao passar por aí, em frente ao número 1856 da rua Pio XI. É pouco. Mas me conforto por saber que, talvez, possa inspirar outros a ajudar a te proteger, resistir e continuar sendo uma fonte de vida e beleza
Beth – Figueira
Olá, Figueira da R. Dr. Alberto Seabra! Não precisa balançar seus galhos de um lado para o outro procurando o dono desta missiva (Uau!). A carta é para você mesma! Quanta surpresa junta, não é mesmo? Primeiro porque atualmente quase ninguém escreve carta, depois porque a carta é endereçada a uma árvore. Mas acho que você merece! Nossa família conhece você desde que nasceu, sabia? Você foi plantada por um senhor que já não está mais conosco. Ele queria ter sombra para ficar “apreciando” o movimento da rua sentado num banquinho de madeira que talvez ele mesmo tenha feito. No começo, os amigos do meu marido brincavam dizendo que era o velhinho que fazia sombra para você, mas o tempo passou e você cresceu. Hoje o velhinho não está mais lá, e quem cuida de você é o novo morador da casa: um jardineiro […] quero dizer que somos muito felizes por ter uma árvore como você, cercada de tanto carinho e cuidado. Um abração! (Ainda consigo abraçar seu tronco, viu?)


Beto – Oliveira
“Não sou daqui. Falo de longe, muito longe. Mas me disseram que uma carta seria bem recebida por essa gente brasileira. Disseram que eu teria espaço para poder escrever o que sinto, das minhas alegrias e das minhas angústias. Eu nasci na Palestina, em Gaza, que tanto eu amo. Minha idade? …Fico até sem jeito de dizer a minha idade… Mas já presenciei tanta felicidade e paz por aqui… Vocês não têm ideia! Por vezes pareciam sonhos infinitos, do nascer ao pôr do sol! Tudo isso me levava a acreditar que valeria a pena continuar nesta aventura que é viver. Justo neste ano em que esta velha senhora completa 2035 anos de idade, …sim, acreditem, brotei há 2035 anos!!…estou vendo coisas que jamais pensei em ver, nem mesmo com a gente. Muitas de nós estão sendo extirpadas desta terra e, pasmem, incendiadas!!Sobrevivo, mas nesse momento a alma aflige e não me resta outra coisa a não ser chorar e muito por essa gente, por esse povo Palestino que, como nós, está sendo, brutalmente assassinado e arrancado das suas terras. Seus frutos, como os nossos, não chegam a completar nem a tenra idade, dá pra imaginar? Que dor profunda. Farei o que sempre fizeram os Palestinos, vou me fortalecer e fazer brotar em mim as mais fortes das raízes.”
