Meses atrás provocamos nossos vizinhos a escreverem uma carta, uma mensagem, para as árvores que admiram, que cruzam os seus caminhos, que embelezam e acolhem passarinhos nas praças, que fazem sombra em suas calçadas, que oferecem um deleite para seus olhares.
E por qual razão fizemos esse convite? Porque precisamos das árvores mais do que nunca. Seja por questões socioambientais, seja porque são maravilhosas, as admiramos e as queremos bem.
Aqui vão trechos das declarações de carinho e cumplicidade que recebemos. Já contou pra sua árvore preferida o quanto ela é importante pra você?

Nina – Figueira
“Para minha querida Universus numerosis. Eu te conheço há mais de 50 anos. Quando te vi pela primeira vez, no colo do meu avô, já te chamava assim: A Grandona. Dizem que é centenária, eu acho que você é duzentenária. Mesmo meu avô me erguendo nos braços, você já era grande. Eu nunca consegui te alcançar e é por isso que te escrevo. Ao contrário de mim, você me alcança sempre que passo por perto. Não sei seu nome de família. Dizem que é figueira-de-bengala ou Ficus benghalensis. Nome pomposo que eu trocaria por Universus numerosis. Sabe por quê? É que dá para ficar horas vendo seus troncos, o entra e sai de cada curva, a formiga a aranha o besouro o sabiá a folha amarela verde brilhante na chuva no sol no céu da noite. Você é tão enorme que cabe todos os universos que a gente imagina. Tenho certeza que tem gnomos aí dentro, você é bisavó do Groot, que tal uma rede lá no topo, um mirante, um comedouro, uma horta para quem voa? Quanta coisa você abraça? Hoje quando fui te fotografar, tinha uma bicicleta descansando no seu pé. Ela fazia cosquinhas? Uma volta ao seu redor é um carrossel para gente retomar o fôlego. Diminuir o passo quando estiver debaixo da sua copa e lembrar que quando vocè for trezentenária, alguém vai carregar uma criança no colo, apontar para cima e dizer: “Olha que árvore Grandona! Sabia que ela guarda universos?”
Patrícia – Ipê Amarelo
“Você está sempre no meu caminho entre a casa e o trabalho! Na maior parte do tempo você está imperceptível. De repente você floresce! Lá por agosto, de um dia pro outro, que alegria sinto no meu coração! São poucos os dias dessa alegria, eu tenho que aproveitar! Algumas vezes paro para te fotografar, mas sempre fico decepcionada, a foto não transmite a beleza que você me oferece! Nesses dias eu fotografo e mando a foto para o meu irmão, ele adora os ipês floridos! Você sempre faz eu me conectar com ele e por isso fazer um gesto de amor, da mesma forma que você se conecta comigo por meio de suas flores, aposto que com outras pessoas também! Obrigada por existir!”


Patrícia O. – Sibipiruna
“Olá querida árvore! Até agora só você sabia que sem sua sombra nos dias de calor, sem sua alegria de folhas verdinhas e novas no começo da primavera, sem suas flores do amarelo mais vivo e brilhante que há, minha casa não seria o melhor lugar do mundo! Agora tudo mundo vai saber! E vou ficar muito feliz em receber quem quiser te conhecer para te apresentar, Dona Sibipiruna majestosa, que mora aqui conosco e nos abraça generosa. Obrigada por tudo!”
Patrícia G. – Jabuticabeira
“Oi minha linda Jabuticabeira! Você era uma arvrinha e agora é uma arvrona. Você chegou aqui há 23 anos, foi presente de casamento. Você traz sombra para minha garagem, refresca minha sala e ainda nos dá frutinhas deliciosas, e ainda dividimos com os passarinhos. Muito obrigada por tudo isso. Eu te amo e você sempre vai estar conosco.”


Paulina
“Cada vez que te visito, me lembro do termo japonês “banho de floresta”. Não porque você esteja numa floresta, mas pela sensação de calma e paz que me transmite. Nos dias felizes, saio mais feliz. Nos dias não tão felizes, saio com esperança que virão dias melhores!”


Ricardo – Cerejeira do Rio Grande
Tantos segredos você guarda nos botões que ainda estão por vir
Como também em suas raízes, árvore nativa, brasileira das matas
Quantos desejos de vida, escritos em folhas brancas foram depositadas aos seus pés
Tragados em sua seiva que escutou lágrimas lavadas pela chuva
Sim, lágrimas da partida de BIBI, jovem talentosa artista brotando
Gigante metamorfose você representa
Bibi presente na sua seiva, Cerejeira adolescente
Pronta para receber sua primeira primavera neste solo amado da Praça Rainha
Que venham as chuvas, os ventos, os guardiões para te cuidar e te celebrar com suas raízes, folhas, flores e frutos ao lado das sabias inscrições “Sou Feliz, Alegre e Forte, Para sempre, BIBI “
Silvério _ Quaresmeira
“Olá jovem quaresmeira! Você é para mim a árvore mais importante do mundo. Nos vemos frequentemente e fico observando seu crescimento. Ainda pequena e frágil, exige alguma atenção e cuidados, mas sei que em alguns anos você será tão bela, forte e imponente quanto a incrível pessoa que você representa, a inesquecível Jussara.”


Silvia – Aroeira
“Te conheço desde uma mudinha. Tantos anos se passaram, chuvas e ventanias e você continua firme como uma verdadeira aroeira. Elegante, grande, galhos forte e altos e com seu perfume atraindo revoadas de libélulas. Os mais antigos dizem ter enorme poder curativo nas suas folhas e óleos essenciais. Eu somente te admiro observo e seu porte imponente.”
Sílvia S. – Árvores do Rainha
“Oi árvores, não sei quem vocês são, mas sou eternamente grata à companhia que fazem para minha mãe. Ela mora em frente a vocês e, todos os dias, quando estamos na sala, o passatempo dela é dizer como vocês estão.
— Olha como você está quietinha, bonitinha, não quer nada com nada…. não se mexe. Ela é bonitinha.
— Ó, ó. Olha como ela é sem vergonha, se mexe o tempo todo. Ela se mexe de vento. Ela está falando: alô pessoal!! Tudo bem? Tudo calmo?
— A outra é maior, talvez por isso não pode se mexer…Tô achando bonito ter plantas por perto. São todas bonitas.
Essas são algumas frases dela, então é importante contar para vocês um bem que vocês fazem para uma mulher que acabou de ficar viúva, com 92 anos. Vocês trazem alegria para a vida dela. Sou eternamente grata! Muito obrigada!!”


Simone – Manacá
“Ah, manacazinho, quem diria que, tantos anos depois de te conhecer, estaria te escrevendo uma carta de admiração e agradecimento? A ideia surgiu com a turma das Vilas Beija, para homenagear as árvores que gostamos nos bairros. Nos últimos tempos, temos perdido muitas árvores na cidade. Quem sabe, assim, conseguimos sensibilizar os moradores sobre sua importância não só para o meio ambiente, mas, principalmente, para nossos corações. Anos a fio, passei por você a caminho da escola em que trabalhava, lá no Capão Redondo, lugar árido, quase sem áreas verdes, ao contrário de onde estamos. Te vi florescer muitas vezes, você está meio apertado, dentro de um caixote de cimento, colado num poste, numa calçada que também não é amistosa com os pedestres. Será que, na correria, as pessoas te admiram quando você floresce? É um espetáculo quando suas flores nascem. Primeiro roxinhas que, aos poucos, se tornam brancas. O mais bonito é que suas flores adquirem várias tonalidades ao mesmo tempo. E o aroma das flores, então! A rua fica toda perfumada, dá para sentir de longe. Impossível não te notarem!”
Sonia – Ipê Amarelo
“Minha ipê amarela. Um dia você apareceu no meu quintal e quando te reconheci fiquei muito contente de morar com você. Mas o tempo passou e tudo mudou. Antes que meu quintal ficasse todo florido com suas pétalas amarelas, suas raízes se anteciparam em causar problemas …. você sabe como é, quintal pequeno com raízes grandes… é inviável. Tive que arrancá-la de mim 😭. E agora quando olho pela janela sinto um vazio tão grande de não te ver mais ali. Saudades…”


Suzana – Ipê Amarelo
“Meu querido Ipê amarelo, quando nos conhecemos, você ainda era uma muda tímida e magrinha que foi plantada pela minha mãe, fã incondicional de todos da tua espécie, bem na frente de casa. A princípio, tínhamos certeza de que você daria flores em buquês de bola, como prometeu o chacareiro que te vendeu. E então você foi crescendo, crescendo, e um belo dia deu sua primeira flor amarela, solitária, sem buquê nem nada. Sim, é verdade, me decepcionei com você, embora não fosse culpa sua. Mas, mesmo assim, fui acompanhando com amor seu crescimento, centímetro por centímetro e curtindo cada florada. Você sempre foi fonte de muitos elogios. Todos os que frequentavam nosso ateliê para participar de oficinas de tintas naturais, formação de professores ou encontros pais e bebês, ficavam encantados com sua bela presença, dando ao espaço ares de mata atlântica. Essa cidade merece muitos ipês!”
Sylvia – Pau Ferro
“Gosto muito de ver você, árvore nativa da Mata Atlântica que encontramos nas ruas, praças e parques da cidade. Seu tronco com diferentes tons de marrom é lindo. Suas sementes estão em vagens cascudas e cheirosas. Fico feliz quando te vejo. Abraços”


Tatiana – Quaresmeira e Flamboyant
“Tibouchina granulosa (quaresmeira) e Delonix regia (flamboyant), cohabitando e ofertando!”
Thais – Abacateiro
Eu acato o teu ato,
Mas você não me abate
Eu quero um abacate….
O abacate tá muito alto
Não pego nem com um salto
Você sua árvore frondosa
Sabe que eu sou teimosa
Eu não saio daqui
Até um abacate cair…


Thais – Pau Ferro
“Querido Pau Ferro, eu te acho tão lindo, tão atraente, você tem um tronco muito forte e malhado. Não paro de olhar para você! Sabe, eu não gosto muito da rua onde você está, acho uma rua meio esquisita, sem árvores e muitos carros, mal-cuidada. Mas você, ali quase no topo dela, vendo o bairro todo abaixo de você, quantas mudanças você já viu na nossa Vila Ida, aquela das idas e voltas.
Você já enxergou toda a baixada do bairro se transformar, as ruas se asfaltarem, as pessoas indo e vindo, nascendo e morrendo, os terrenos serem construídos, os rios se aterrarem, os pássaros e bichos fugindo. Agora, imagino que anda muito assustado com os prédios que parece que vão te engolir que pipocam ao seu lado todos os dias. E todos estes extremos climáticos têm derrubado alguns conhecidos seus em outras partes da cidade, que susto levei ao vê-los no chão.
Mas, querido, não se assuste. Aterre-se bem neste solo das vilas e continue mirando aí do alto nossas pequenas vidas. Espero que o chique condomínio Mirá (aposto que foi você quem deu este nome né?) em que você está continue cuidando bem de você. Você vai resistir a essa loucura toda por aí, e a toda esta gente que não entende seu valor. Eu passo sempre debaixo de você, qualquer coisa me avisa, joga um galhinho, manda um passarinho piar (ou até fazer um cocozinho na minha cabeça, eu te perdoo…). A gente chama os amigos, tá cheio de gente que gosta das árvores por aí. Continue lindo e forte por muitos anos, para os mais novos poderem se enamorar de você também. Um beijo grande”
Tulio – Paineira
“Querida Paineira, passando para agradecer a alegria que sinto ao ver a sua exuberância, sua resistência e vigor em meio a esta “selva de pedra”! Desejo muita saúde e resiliência para que sempre esteja presente quando eu passar pela Rua Rodésia! Com amor, Tulio


Valter – Araribá
“Ter te descoberto aqui no bairro foi algo tão maravilhoso, que às vezes passo por você e custo a acreditar que é você mesmo, uma espécie tão imponente, magnífica e solitária nessas bandas. Te imagino desejando outros araribás adultos por perto, carregados de flores, frutos e recebendo a visita de centenas de pássaros e insetos. Mas como uma andorinha só não faz primavera, os cantos dos papagaios e araras ficam só na imaginação. Toda vez que passo pela sua sombra e vejo suas lindas sementes caídas sobre o asfalto te agradeço por seguir tentando germinar, espalhando possibilidades para essa região voltar a ser mais biodiversa e conectada à terra. Obrigado por seguir resistindo araribá, árvore das araras.”
Vera – Mangabeira
“De dentro do carro de repente surgem pencas de flores amarelas e homens de amarelo batem com varetas nos seus galhos. Ai, será q vieram cortar? Mais tarde a vejo intacta, bela, a amarelar, e muitos frutos no chão. Serão gabirobas? Ainda não sei, mas só agora noto que o amarelão são folhas, não flores. E suas frutas -cobiçadas, cheirosas- como se chamam? A cantoria dos pássaros na maior das alegrias está uma delícia de ouvir aqui de perto, seu esplendor é presencial, é real e encantador. Quero dizer que te amei à primeira vista e quero vê-a sempre, saber seu nome, honrá-la com o meu reconhecimento humano e agradecer por sua existência.”


Viviane – Jabuticabeira
“Minha jabuticabeirinha, nascida de uma semente da Sabará mais gostosa do bairro. Sua mãe está lá na Diógenes, ao lado da Casa de Repouso onde estava meu pai, que também gostava muito das jabuticabeiras. Fui visitá-lo, em plena pandemia, e vi a árvore linda, cheia de frutos. Você, peguei no chão e plantei. Agora acompanho seu crescimento, em um vaso, pobrezinha, mas fiz assim para poder te levar comigo para onde eu for. As jabuticabeiras são as árvores da minha infância, das férias na chácara dos avós, de subir e comer até não poder mais. Dizem que quem planta jabuticabeiras tem esperança no futuro. Eu renovo as minhas esperanças cada vez que te vejo.”
Viviane – Pitangueira
“Minha filha! O que fizeram com sua cabeleira?? Você tinha ramos naturais tão lindos…te podaram, te arredondaram para te domar mas sua natureza é mais forte e logo outros galhos subiram na sua forma original. Mas, como podemos resolver esta parte de baixo do seu penteado? Por que não deixam as árvores em paz? Em sua forma, em seu crescimento? Continuarei te admirando, curiosa em saber que formas você vai criar.”

